Fundamentos da Cinemática
1. O que é Mecânica
Mecânica é a ciência que estuda os movimentos.
Por razões didáticas, a Mecânica costuma ser dividida em três capítulos:
I. Cinemática
II. Dinâmica
III. Estática
A Cinemática é a descrição geométrica do movimento, através de funções matemáticas, isto é, é o equacionamento do movimento.
Na Cinemática usamos apenas os conceitos da Geometria associados à ideia de tempo; as grandezas fundamentais utilizadas são apenas o comprimento (L) e o tempo (T).
A Dinâmica investiga os fatores que produzem ou alteram os movimentos; traduz as leis que explicam os movimentos.
Na Dinâmica utilizamos como grandezas fundamentais o comprimento (L), o tempo (T) e a massa (M).
A Estática é o estudo das condições de equilíbrio de um corpo.
2. Ponto Material ou Partícula
Ponto material (ou partícula) é um corpo de tamanho desprezível em comparação com as distâncias envolvidas no fenômeno estudado.
Quando as dimensões do corpo são relevantes, para o equacionamento de seu movimento, ele é chamado de corpo extenso.
Exemplos
(I) Um automóvel em uma viagem de São Paulo ao Rio de Janeiro (distância de 400km) é tratado como ponto material, isto é, o seu tamanho não é importante no equacionamento de seu movimento.
(II) Um automóvel fazendo manobras em uma garagem é tratado como corpo extenso.
(III) Um atleta disputando a corrida de São Silvestre (extensão de 15km) é tratado como ponto material.
(IV) Um bailarino executando piruetas é tratado como corpo extenso.
(V) O planeta Terra em seu movimento de translação em torno do Sol é tratado como ponto material.
(VI) O planeta Terra em seu movimento de rotação é tratado como corpo extenso.
Quando se estuda a rotação de um corpo, suas dimensões não são desprezíveis e o corpo é sempre tratado como corpo extenso.
Ponto material tem tamanho desprezível, porém sua massa não é desprezível.
3. Posição de um Ponto Material
A posição de um ponto material é definida pelas suas coordenadas cartesianas (x, y, z).
O conjunto de eixos Ox, Oy e Oz, de mesma origem O e perpendiculares entre si, é chamado sistema cartesiano triortogonal.
Se o ponto material estiver sempre no mesmo plano, sua posição poderá ser definida por apenas duas coordenadas cartesianas: x e y.
Se o ponto material estiver sempre na mesma reta, sua posição poderá ser definida por uma única coordenada cartesiana: x.
4. Referencial ou Sistema de Referência
O sistema cartesiano triortogonal deve ser fixado em um local, em relação ao qual pretendemos estudar a posição do ponto material.
Esse local é chamado sistema de referência ou referencial.
Quando o referencial for omitido, vamos assumi-lo como sendo a superfície terrestre.
5. Repouso - Movimento
Repouso e movimento são conceitos relativos, isto é, dependem do referencial adotado.
Não existe repouso absoluto nem movimento absoluto.
Uma partícula está em repouso, para um dado referencial, quando sua posição permanece invariável, isto é, as três coordenadas cartesianas (x, y e z) permanecem constantes no decurso do tempo.
Uma partícula está em movimento, para um dado referencial, quando sua posição varia no decurso do tempo, isto é, pelo menos uma das coordenadas cartesianas está variando.
Exemplos
(I) Considere um carro em uma rua e um poste. O velocímetro do carro marca 100km/h. O motorista do carro está em repouso ou em movimento? A resposta correta é: depende do referencial.
Se o referencial for a superfície terrestre, o poste estará em repouso e o motorista estará em movimento a 100km/h.
Se o referencial for o carro, o motorista estará em repouso e o poste estará em movimento a 100km/h.
(II) Considere um avião em pleno vôo e um passageiro dormindo em uma poltrona.
Se o referencial for o avião, o passageiro estará em repouso, e, se o referencial for a superfície terrestre, o passageiro estará em movimento.
6. Trajetória
Trajetória de um ponto material é o lugar geométrico das posições ocupadas pelo ponto material no decurso do tempo, isto é, é a união de todas as posições por onde o ponto material passou.
P1: posição no instante t1 |
P2: posição no instante t2 |
• |
Pn: posição no instante tn |
A linha geométrica P1, P2, ...., Pn (união de todas as posições por onde o ponto material passou) é a trajetória do ponto material.
Para uma trajetória plana, a equação da trajetória é a equação que relaciona as coordenadas cartesianas x e y entre si.
Se o ponto material estiver em repouso, ele ocupará uma única posição no espaço, e a sua trajetória se reduzirá a um ponto.
Como a trajetória está ligada ao conceito de posição, concluímos que:
A trajetória depende do referencial adotado. |
Exemplo
Considere um avião voando em linha reta, paralela ao solo horizontal, com velocidade constante de intensidade 500km/h, em um local onde o efeito do ar é desprezível.
Num dado instante, o avião abandona uma bomba.
Qual a trajetória descrita pela bomba?
- Para um referencial ligado ao avião, a bomba terá apenas a queda vertical provocada pela ação da gravidade e sua trajetória será um segmento de reta vertical.
- Para um referencial ligado à superfície terrestre, a bomba terá dois movimentos simultâneos:
(1) movimento horizontal para frente com a mesma velocidade do avião (500km/h) mantido graças a uma propriedade chamada inércia;
(2) movimento de queda vertical provocado pela ação da gravidade.
A superposição destes dois movimentos origina uma trajetória parabólica.
A Trajetória da bomba depende do referencial.
- Para um referencial ligado à própria bomba, ela está em repouso e sua trajetória será um ponto.
7. Espaço (s)
Considere uma trajetória orientada e um ponto O, escolhido arbitrariamente como referência.
Seja A a posição do ponto material em um instante t.
Define-se espaço (s), no instante t, como sendo a medida algébrica (leva em conta o sinal) do arco de trajetória OA.
O espaço (s) indica apenas onde está o móvel na trajetória, isto é, o espaço é um indicador da posição do móvel.
O espaço não indica a distância que o móvel percorreu, mas apenas o local onde ele se encontra.
O espaço pode ser positivo (ponto A), negativo (ponto B) ou nulo (ponto O).
O ponto de referência (O) é denominado origem dos espaços.
Dizer que o espaço (s) é nulo, num dado instante, significa apenas que, naquele instante, o móvel está posicionado na origem dos espaços.
8. Função Horária dos Espaços: s = f(t)
Quando um ponto material está em repouso, o seu espaço permanece constante, podendo ser igual a zero (parado na origem dos espaços) ou diferente de zero (parado fora da origem dos espaços).
Quando um ponto material está em movimento, o seu espaço (s) varia com o instante (t).
A função que relaciona o espaço (s) com o tempo (t) é denominada função horária dos espaços ou, simplesmente, equação horária do movimento, denominação equivocada, pois trata-se de uma função, e não de uma equação.
Quando a equação horária é do 1º grau, temos o movimento chamado uniforme.
Quando a equação horária é do 2º grau, temos o movimento chamado uniformemente variado.
Exemplos
Movimentos Uniformes
(1) s = 2,0 + 5,0t (Sl)
(2) s = 4,0t (Sl)
Movimentos Uniformemente Variados
(3) s = – 3,0 + 8,0t – 5,0t2 (Sl)
(4) s = 4,0 + 2,0t2 (Sl)
(Sl) – Sistema Internacional de Unidades: o tempo (t) é medido em segundos; o espaço (s) é medido em metros.
9. Espaço Inicial (S0)
Denomina-se origem dos tempos, instante inicial ou instante de referência o instante t = 0.
Na origem dos tempos, o móvel ocupa uma posição (P0), que é definida por um espaço (s0) denominado espaço inicial.
Observe que o espaço inicial (s0) indica apenas onde está o móvel no instante t = 0.
Nas equações de (1) a (4) citadas anteriormente, o espaço inicial vale, respectivamente:
(1) s0 = 2,0m;
(2) s0 = 0;
(3) s0 = – 3,0m;
(4) s0 = 4,0m.
Um instante t positivo significa posterior à origem dos tempos e um instante t negativo significa anterior à origem dos tempos.
Não se pode confundir a origem dos tempos (instante t = 0) com a origem dos espaços (posição em que s = 0).
Quando o espaço inicial é nulo (s0 = 0), então, na origem dos tempos (t = 0), o móvel está posicionado na origem dos espaços (s = 0).
Exercícios Propostos
1. Conta-se que um curioso incidente aconteceu durante a Primeira Guerra Mundial. Quando voava a uma altitude de dois mil metros, um piloto francês viu o que acreditava ser uma mosca parada perto de sua face. Apanhando-a rapidamente, ficou surpreso ao verificar que se tratava de um projétil alemão.
(J. Perelman. Aprenda física brincando. São Paulo: Hemus, 1970.)
O piloto consegue apanhar o projétil, pois
a) ele foi disparado em direção ao avião francês, freado pelo ar e parou justamente na frente do piloto.
b) o avião se movia no mesmo sentido que o dele, com velocidade visivelmente superior.
c) ele foi disparado para cima com velocidade constante, no instante em que o avião francês passou.
d) o avião se movia no sentido oposto ao dele, com velocidade de mesmo valor.
e) o avião se movia no mesmo sentido que o dele, com velocidade de mesmo valor.
2. (MODELO ENEM) – Uma garota ganhou um carro novo e a 100km/h colide com um poste. Ao prestar depoimento na delegacia, ela afirma ao delegado que não teve culpa alguma. O delegado espantado argumenta:
Como você não teve culpa? Você bateu num poste.
A garota, acuada, usa argumentos da Física para justificar o seu erro ao volante.
Sr. Delegado, o senhor não sabe a que velocidade vinha o poste!!!
Do ponto de vista estritamente da Física,
a) a frase da garota é absurda, pois um poste não pode estar em movimento.
b) os conceitos de repouso e movimento não dependem do referencial adotado.
c) o argumento da garota, embora seja absurdo para explicar a colisão, tem conteúdo físico: se o referencial for o carro, a garota está em repouso e o poste se movimenta a 100km/h.
d) para um referencial fixo no solo terrestre, a garota estava em repouso.
e) para um referencial fixo no carro o poste estava em repouso.
3. (UNESP-MODELO ENEM) – A fotografia mostra um avião bombardeiro norte-americano B52 despejando bombas sobre determinada cidade no Vietnã do Norte, em dezembro de 1972.
(www.nationalmuseum.af.mil. Adaptado.) |
Durante essa operação, o avião bombardeiro sobrevoou, horizontalmente e com velocidade vetorial constante, a região atacada, enquanto abandonava as bombas que, na fotografia tirada de outro avião em repouso em relação ao bombardeiro, aparecem alinhadas verticalmente sob ele, durante a queda.
Desprezando-se a resistência do ar e a atuação de forças horizontais sobre as bombas, é correto afirmar que
a) no referencial em repouso sobre a superfície da Terra, cada bomba percorreu uma trajetória parabólica.
b) no referencial em repouso sobre a superfície da Terra, as bombas estavam em movimento retilíneo acelerado.
c) no referencial do avião bombardeiro, a trajetória de cada bomba é representada por um arco de parábola.
d) enquanto caíam, as bombas estavam todas em repouso, uma em relação às outras.
e) as bombas atingiram um mesmo ponto sobre a superfície da Terra, uma vez que caíram verticalmente.
4. (FUNDAÇÃO CARLOS CHAGAS-MODELO ENEM)
A invenção do basquete
Um esporte que pudesse ser praticado por várias pessoas, fácil de aprender, que pudesse ser adaptado a um espaço fechado e não fosse violento. Esse foi o pedido que o diretor da Faculdade Springfield, de Massachussetts, fez ao professor James Naismith. No rigoroso inverno de 1891, era necessário inventar alguma atividade esportiva que motivasse os alunos, impossibilitados de praticar esportes ao ar livre e entediados com as aulas de ginástica.
Naismith meditou na encomenda do diretor: para um jogo coletivo, pensou logo na bola. Mas não queria que ela fosse chutada ou ficasse muito tempo retida nas mãos dos jogadores. A bola teria de ser rapidamente atirada para um alvo, acima da cabeça dos jogadores. Para acertar o alvo, eles deveriam lançar a bola descrevendo uma parábola, o que evitaria a violência do arremesso na horizontal. Essas seriam as regras básicas.
(Walter Spinelli. Matemática. S. Paulo: Nova Geração, v.1. 2005. p. 75.)
Após sofrer uma falta, um jogador arremessou a bola rumo à cesta. A altura h da bola, relativa ao solo, é dada em função do tempo de movimento t pela relação:
h = 2,1 + 10,0t – 4,9t2 (SI) |
A altura da cesta é H = 2,5m.
Podemos afirmar que:
a) No instante em que a bola deixa a mão do atleta, ela está a uma altura de 2,0m do chão.
b) No instante t = 2,0s, a bola está na altura da cesta.
c) A altura do atleta é de 2,1m.
d) No instante t = 1,0s a bola está na altura da cesta.
e) A função dada permite obter a altura do atleta que lançou a bola.
Gabarito
1. RESOLUÇÃO:
Se a bala e o avião tiverem velocidades iguais (em módulo, direção e sentido), então a bala estará em repouso em relação ao avião e o piloto poderá pegá-la sem sofrer dano algum.
Resposta: E
2. RESOLUÇÃO:
Os conceitos de repouso e movimento são relativos, pois dependem do referencial adotado. Em relação ao solo, o poste está em repouso e a garota estava a 100km/h; em relação ao carro, a garota está em repouso e o poste está a 100km/h.
Resposta: C
3. RESOLUÇÃO:
Em relação ao avião, cada bomba cai verticalmente. Em relação ao solo terrestre, cada bomba descreve uma parábola resultado da combinação de dois movimentos simultâneos:
1) Movimento horizontal, mantido por inércia, com velocidade igual à do avião.
2) Movimento vertical sob ação da gravidade.
Resposta: A
4. RESOLUÇÃO:
a) Falsa
Para t = 0, temos h = h0 = 2,1m
b) Verdadeira
Para t = 2,0s, temos:
h = 2,1 + 10,0 . 2,0 – 4,9 . (2,0)2 (m)
h = 2,5m
c) Falsa
A altura do atleta está indeterminada
d) Falsa
Para t = 1,0s, temos h = 7,2m
h = 2,1 + 10,0 – 4,9 (m)
h = 7,2m
e) Falsa
Resposta: B
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